domingo, 15 de novembro de 2009

Haiti: Fora as tropas da ONU comandadas pelo exército de Lula


Por Mara Onijá, dirigente da LER-QI e integrante do Pão e Rosas
Do jornal Palavra Operária # 63

No último dia 13 de outubro, uma vez mais foi renovado pelo Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) por unanimidade o prazo para manutenção da MINUSTAH [1]. Ao longo desses cinco anos de ocupação, temos expressado no Jornal Palavra Operária as diversas denúncias sobre o verdadeiro papel que cumprem as tropas da ONU neste país, comandadas desde o início da missão pelo exército brasileiro. Assassinatos, estupros, repressão às mobilizações populares e às tentativas de organização sindical dos trabalhadores haitianos são alguns dos exemplos do que configura a atuação dos chamados “capacetes azuis” no Haiti.O governo de Lula e os homens que ocupam os altos postos nas tropas brasileiras retomam com mais hipocrisia seus discursos humanitários sempre que surjem novas denúncias sobre a realidade que enfrenta o povo haitiano – que, aliás, até hoje se manifesta contra a ocupação, tendo que enfrentar ainda uma situação de extrema miséria que chega ao ponto de ter bolos de lama como parte de sua alimentação.

Todos os anos, ao anunciar a renovação do prazo da ocupação, a ONU faz questão de dizer que ainda há muitos desafios para conquistar a paz no Haiti, que deve estar ligada a uma estabilização política e desenvolvimento econômico. Pela segunda vez, um dos objetivos da ocupação está relacionada à organização das eleições, que ocorrerão em 2010. A eleição que colocou em 2006 no poder René Preval, atual presidente, se deu já com o país ocupado, marcada por fraudes e manifestações de protesto por parte do povo haitiano.

René Preval é um agente da política do imperialismo estado-unidense e francês, países que historicamente arrancaram as riquezas e o sangue das terras haitianas. Não bastassem os lucros que a França obteve ao longo da colonização de São Domingos, a absurda dívida que o Haiti segue pagando até hoje, o saque e a opressão imperialista dos Estados Unidos ao longo do século XX – orquestrando vários golpes e ditaduras no Haiti –, hoje o que chamam de desenvolvimento da economia significa a privatização do sistema de saúde, portos, aeroportos, etc. Isso está acompanhado pelo estabelecimento de empresas transnacionais em 18 zonas de “livre comércio” que superexploram a força de trabalho haitiana com um salário mínimo de 1,70 dólar por dia, o que equivale a 70 reais por mês. Mais alarmante que isso é saber que cerca de 80% da população do país vive abaixo da linha de pobreza e está desempregada.Como já dissemos anteriormente, o fato de o Haiti ter hoje um presidente negro nada representa de avanço para a população haitiana, que se constitui por 95% de negros. Preval segue apoiando a manutenção das tropas, ou seja, entre Preval e o povo negro do Haiti existe um rio imenso de sangue. Os dados sobre a repressão no Haiti descarregada pela PNH (Polícia Nacional Haitiana) em conjunto com as tropas da MINUSTAH assustam e denunciam o verdadeiro caráter dessa missão. É parte fundamental de seu objetivo reprimir a resistência que se expressa tanto em manifestações pela retirada das tropas e também por outras demandas urgentes como foi no início do ano passado quando houve grandes protestos contra a fome e a carestia dos alimentos e neste ano pelo aumento do salário mínimo. Em ambos os casos, as tropas da ONU cumpriram seu papel de reprimir brutalmente.
Somente como exemplo, podemos mencionar algumas ocasiões que foram noticiadas internacionalmente. Numa madrugada em julho de 2006, cerca de 300 soldados – grande parte brasileiros – mataram mais de 60 haitianos em apenas dois bairros (Cité Soleil e Bois Neuf). Contrariando o discurso de que a partir do governo de Preval o país avança para uma maior “paz social”, em junho deste ano as tropas seguiram cumprindo seu papel repressivo assassinando um homem – segundo relatos, atingido pelo exército brasileiro – num protesto contra a ocupação, o que gerou revolta ainda maior.

No Mês da Consciência Negra, quando todo o movimento negro resgata as histórias de resistência à escravidão e ao racismo, trazendo à tona exemplos de confronto às elites como a Revolta dos Malês e o Quilombo dos Palmares, entre tantos outros exemplos, silenciar sobre a realidade atual do Haiti significa falar do passado para encobrir uma atuação impotente e atrelada ao governo Lula. O que pode explicar que amplos setores do movimento negro, após cinco anos de ocupação, não tenham colocado de pé uma ampla campanha pela retirada das tropas e pela defesa do povo negro haitiano frente à opressão imperialista da França e dos Estados Unidos, mantida hoje pelas tropas da ONU, comandadas pelo governo brasileiro?A luta contra o racismo é internacional e para se fortalecer precisa ter como um dos seus fundamentos a luta anti-imperialista. O fato é que o governo Lula, ainda que hoje tenta concretizar algumas ações na política internacional que lhe garanta relativa autonomia regional, a verdade é que este governo não deixa de compactuar com os projetos do imperialismo, o que tem sua maior expressão do comando das tropas no Haiti. E para o povo haitiano nada mudou com o fato de os Estados Unidos ter hoje um presidente negro. Obama governa para a burguesia imperialista e apesar de toda a demagogia com a diminuição lenta e gradual das tropas de ocupação no Iraque, temos visto a ofensiva no Afeganistão. No Haiti, nada mudou!

Sobre os que preferem manter a imagem de Lula, defendendo o mesmo governo que aplica mais e mais verbas para a repressão nos morros e favelas, é preciso dizer que estão renunciando a defender o povo negro do Haiti. Está feito o chamado a todos que estão dispostos a defender consequentemente o povo negro haitiano, que historicamente protagonizou a revolução de São Domingos, conquistando a independência a partir do levante dos negros escravizados que expulsaram os brancos colonizadores da ilha. No Mês da Concsiência Negra, saímos a dizer: a luta pela emancipação do povo negro passa pela defesa do povo haitiano. Fora as tropas do Haiti!

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