quinta-feira, 21 de maio de 2009

A Precarização tem rosto de mulher

Por Milena Bagetti integrante do Pão e Rosas e Clarissa Menezes militante da LER-QI, estudantes da pós-graduação da Unicamp e UFRJ

No Brasil nestes últimos anos de crescimento econômico pudemos observar que as mulheres, que historicamente ocupam os postos de trabalhos com menor remuneração além de terem que realizar todo trabalho doméstico, ocuparam também grande parte dos trabalhos precários, temporários. Hoje que vivemos em meio a uma crise capitalista de enormes proporções, devemos saber que o impacto da crise não é igual para todos. Na América Latina a taxa de desemprego é quase duas vezes maior entre as mulheres do que os homens e 60% das mulheres no mercado de trabalho ocupam os postos mais precarizados. Além disso quanto maior a crise econômica, maior será a carga de dupla jornada de trabalho das mulheres, porque com a maior desestruturação da educação, da saúde e dos serviços públicos (que são os primeiros a serem atacados e terem as verbas cortadas), serão mais as tarefas que recairão sobre as mulheres para a reprodução da vida.

No setor de serviços, o qual é composto por cerca de 56,3%[1] da força de trabalho feminina, as trabalhadoras se deparam com tarefas monótonas e repetitivas como nas atividades de telemarketing, sendo que muitas não podem nem ao menos sair da sua cadeira por alguns instantes para ir ao banheiro ou beber água, ainda tendo que passar por situações constrangedoras, pois é um serviço que demanda uma certa paciência, é altamente estressante devido ao assédio moral e a pressão por maior produtividade. Entre as terceirizadas da limpeza, não se faz diferente, pois além de os salários serem míseros, as trabalhadoras ainda não possuem os mesmos direitos que os efetivos e também sofrem de intenso assédio moral por seus encarregados e supervisores, sendo que no contexto de demissões, as trabalhadoras que não são demitidas, precisam fazer o seu serviço e o das suas colegas que foram demitidas, intensificando ainda mais o quadro de exploração.

Apesar de evidenciarmos uma crescente ampliação do mercado de trabalho para as mulheres, algumas poucas ocupando cargos de chefia, esse “avanço” encontra-se fortemente comprometido, na medida em que o capital vem incorporando cada vez mais o trabalho feminino, nos estratos assalariados industriais e principalmente de serviços, de modo crescentemente precarizado. Com a grande ofensiva neoliberal dos últimos anos, isso vem se traduzindo na intensificação da exploração, pois as mulheres se apresentam como mão-de-obra mais barata que o homem e, em geral, aceitam mais restrições e muitas vezes redução de salário, pois as trabalhadoras também são menos organizadas ou mesmo seus sindicatos acabam negociando os acordos coletivos e redução de direitos com a patronal contra os interesses das trabalhadoras. É neste contexto de exploração, no Brasil as diaristas trabalham sem qualquer direito trabalhista.

Trabalho doméstico e dupla jornada de trabalho

A mídia noticiou neste mês de maio um caso do Paraná de uma diarista que trabalhou 18 anos na mesma casa, nos 8 primeiros anos três vezes por semana e nos 10 anos posteriores duas vezes, em que lhe foi negado pelo Tribunal Superior do Trabalho o direito à carteira assinada e direitos como férias, 13º salário, licença-maternidade remunerada e seguro desemprego[2]. A justificativa para tal decisão atroz do TST é de que o que caracteriza um trabalhador doméstico é a “natureza contínua” de seu trabalho. Ou seja, para a legislação e seus intérpretes, trabalhar 18 anos de duas a três vezes por semana, sem férias, não é considerado trabalho contínuo. É interessante fazer uma comparação: enfermeiras que trabalham em regime de turno, trabalham de três a quatro dias por semana; alguns médicos que trabalham no setor público tem sua jornada semanal de 20 horas; ambos tem direitos. Já uma diarista trabalha cerca de 8 a 11 horas por dia, em apenas 2 dias poderia ter a mesma carga horária que um médico do setor público que possui direitos trabalhistas.

Mas o que está por trás disso? Na sociedade em que vivemos, os capitalistas se utilizam do trabalho doméstico realizado pelas mulheres, para assim poderem lucrar mais. Como? Ora se um patrão tivesse que pagar para que o trabalhador obtivesse sua ‘manutenção’ (higiene, alimentação, vestimenta, saúde) isso lhe custaria um lucro menor. Com as mulheres fazendo isso, de graça, o patrão se exime de pagar pela manutenção (reprodução da vida) desses trabalhadores. Ou seja, este trabalho que as mulheres realizam não é um serviço pessoal, mas se localiza na cadeia do funcionamento do sistema capitalista. Desta lógica capitalista decorre que os trabalhos domésticos são considerados como tarefa “natural” das mulheres. E isso é transpassado para as trabalhadoras domésticas com maior exploração de seu trabalho, pois essas mesmo antes dos ataques neoliberais à classe trabalhadora, já eram privadas de direitos trabalhistas.

As trabalhadoras domésticas mensalistas e diaristas em função de que seu trabalho se dá de forma isolada (cada qual na casa em que trabalha) das outras trabalhadoras têm dificuldades de organização, o que por sua via as deixa ‘uma a uma’ na negociação direta com o patrão ou através da “justiça” do trabalho. Por isso é necessário que as trabalhadoras domésticas se organizem para superar esse isolamento e fazerem ouvir suas vozes.

Aos trabalhos precários e sem direitos... para dizermos um BASTA, é preciso nos organizar!

Chamamos a construir o Pão e Rosas e juntas nos organizar para lutar pelos nossos direitos e contra a exploração e opressão!

Pelo direito à licença-maternidade, 13º salário, férias, FGTS e seguro desemprego à todas as trabalhadoras domésticas mensalistas e diaristas! Pelo salário mínimo calculado pelo DIEESE à todos as trabalhadoras! Contra a dupla jornada de trabalho lutemos por creches, lavanderias e restaurantes públicos!

[1] Segundo dados do IBGE de 2006.
[2] G1. Diarista que trabalha até 3 vezes na semana não tem direitos, entende TST. Atualizado em 07/05/09. http://g1.globo.com/

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