domingo, 26 de abril de 2009

Basta de assassinatos de mulheres em Minas Gerais!

Por Ana Tossato, direto de Belo Horizonte

Na última semana notícias sobre mulheres brutalmente assassinadas foram destaque na imprensa burguesa, crimes especialmente ocorridos no estado de Minas Gerais. Segundo o jornal Estado de Minas, apenas nesta última semana foram 12 mulheres assassinadas e cinco estão desaparecidas. Casos como de Priscila Gonçalves de Almeida, que foi executada com 17 tiros em Belo Horizonte e Ana Carolina Assunção, assassinada ao lado do filho de um ano, também na capital. Ou ainda casos de violência sexual e mutilações corporais seguidas de assassinato, como os de Amanda Glívia Vale e Júnia Aparecida da Silva. Em uma semana foram registrados nove casos de mulheres vitimas de estupro e assassinato no estado. Desde o começo do ano foram 21 assassinatos só na capital do estado, índice que se mantinha na mesma época em 2008 e 2007, quando se registrou 22 mortes até abril.

A investigação desses casos é na maior parte das vezes negligente, sendo abandonada antes de concluída, especialmente quando se trata de mulheres pobres, ou casos ocorridos em zonas periféricas das cidades. Exemplo escandaloso do problema foi o processo do assassinato de Glauce Andréia Gonçalves ocorrido em 2005, este ano o suspeito ganhou liberdade porque não foi julgado no prazo estabelecido pela lei. A relação de cúmplice que as estruturas estatais, desde as instâncias da justiça até a polícia, mantém com esses crimes fica clara quando nos remetemos ao caso de Rita Dias da Silva, jogada no Ribeirão Arrudas também em 2005 (caso arquivado pela justiça), Rita era dependente química e antes de morrer ela abordou um policial dizendo saber quem era ‘o dono da droga’ e como prendê-lo[1], o policial não deu atenção à mulher, que foi assassinada 40 minutos depois. Entre os assassinatos cometidos contra mulheres em BH, 219 foram averiguados pela Polícia Civil entre 2006 e 2008, destes, 116 atestam como causa indeterminada. Esses dados confirmam a negligência em resolver a maior parte dos casos, considerando que mais de 50% deles são de ‘causa indeterminada’. Outra face da cumplicidade e negligência com esses crimes está no fato de que a Secretaria de Estado de Defesa Social não ‘poder’ dizer quantas mulheres foram mortas no estado de Minas Gerais nos últimos anos porque um sistema de dados que permita o levantamento dessas estatísticas ainda não foi implementado no interior.

Os casos de violência extrema contra mulheres, entretanto, não são situações isoladas. É um problema generalizado na sociedade capitalista. A violência se manifesta contra as mulheres dentro de suas casas, nos locais de trabalho, nas ruas. Dados da Anistia Internacional, publicados em 2007, denunciam que um bilhão de mulheres, ou uma em cada três do planeta, já foram espancadas, forçadas a ter relações sexuais ou submetidas a algum outro tipo de abuso. Outra face da violência contra a mulher é a hipócrita proibição do aborto, especialmente localizada em países da América Latina e África, onde 20% dos casos terminam em morte das mulheres, que estão sujeitas às condições inseguras do aborto clandestino. O discurso difundido pelos meios de comunicação, controlados pelas classes dominantes, nos leva a considerar o problema desde uma ótica privada e individual, e é ilustrativa dessa questão a terminologia usada para qualificar as formas de violência contra a mulher. Quando o ato é praticado pelo pai, marido e filhos esta violência é qualificada de doméstica, ou seja, de âmbito privado levando a discutir o problema do ponto de vista individual daquela mulher, daquela família e não como uma profunda contradição social que ultrapassa o problema de cada indivíduo. Existe ainda o termo crime passional, que leva a crer que o ato foi praticado pelo impulso da paixão doentia, escondendo mais uma vez a contradição social da questão da opressão feminina no capitalismo, pois os chamados crimes passionais são geralmente dirigidos à mulheres[2] e a freqüente motivação de ciúmes se remete a concepção patriarcal de que as mulheres são propriedades dos homens.

A violência contra a mulher não é, portanto, uma questão individual ou privada como busca pregar a ideologia que é afirmada desde a igreja, até meios de comunicação de massa, e também o Estado. A questão está ligada diretamente a jugo de opressão em que está sujeita a mulher na sociedade capitalista, problema que se aprofunda quando nos remetemos às mulheres trabalhadoras que são obrigadas a enfrentar a dupla jornada de trabalho, arcando com a manutenção da casa e a educação dos filhos, garantindo aos capitalistas os lucros deste trabalho cotidiano não-remunerado que lhes beneficia diretamente. São as trabalhadoras que recebem os piores salários, desiguais em relação aos homens, e trabalham nos piores cargos e em piores condições. Essa condição de vida da mulher na sociedade capitalista se mantém e é naturalizada pela opressão dirigida à mulher, que embora não tenha nascido no sistema capitalista, nele se perpetua e aprofunda justamente porque se torna lucrativa e funcional. A face mais profunda dessa opressão se expressa em estupros, assassinatos, espancamentos. E o sistema que engendra esse tipo de atrocidade não possui nem a capacidade de resolvê-los, nem por sua polícia assassina, nem por seu Estado construído pela burguesia e para a burguesia. Por isso é preciso levantar uma comissão independente constituída pelos familiares das vítimas, que reivindique acesso a todos os dados que detém a justiça sobre esses processos, e dê fim a essas impunidades. E, mais que é isso, é necessário que toda a classe trabalhadora, com seus sindicatos e organizações políticas, levantem a bandeira da luta pelo fim da violência contra as mulheres. Basta estupros e assassinatos em Minas Gerais! Em memória de Priscila, Ana Carolina, Amanda, Júnia, Glauce, Rita e tantas outras mulheres assassinadas em Belo Horizonte desde o começo do ano, dizemos basta!

[1] Segundo o jornal Estado de Minas baseando-se em depoimento do próprio policial.
[2] Um levantamento feito pela ONG União de Mulheres de São Paulo, em 1998, mostrava que 2500 mulheres morriam enquadradas na motivação ‘crime passional’.

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